Hrsta, pronuncia-se 'Hursh-tah'. Surgiu pelas mãos do canadiano Mike Moya, fundador dos míticos Godspeed You! Black Emperor (projecto que abandonou depois do primeiro álbum, F# A# - facto que justifica o nome da música "Moya" no Slow Riot For New Zero Kanada EP, no qual ainda participou, e o início da música "Antennas To Heanven" do trabalho discográfico que seguiu, Lift Your Skinny Fists Like Antennas To Heaven, que é Moya a cantar um excerto de uma música sua intitulada "Baby-O") e um dos nomes comummente associados a Set Fire To Flames e Molasses. Aquilo que caracteriza as composições de Moya é o psicadelismo, que em Hrsta ganha adquire um protagonismo intenso. Hrsta é, por isso, música psicadélica com influências de muita coisa que não interessa; se tivermos de colocar este projecto numa caixinha de sapatos com uma etiqueta, que seja numa que diga "Psicadélico", perto dos Pink Floyd - mas sem os misturar, que falamos em décadas de distância, algo que torna ambas as bandas muito diferentes.
Numa primeira tentativa de deixar a sua marca, Hrsta - falemos assim - legaram um álbum muito calmo, muito lento, com alguns efeitos e muita ambiência: L'éclat du ciel était insouten (2001). Foi nestes termos que o seu caminho ficou logo marcado: com guitarras oscilantes e cheias de delay a delinearem melodias simples em acordes e com a voz de Mike Moya, algo feminina, a arrastar-se de vez em quando, num acompanhamento perfeitamente melancólico, ou com puras derivas e explorações de efeitos excessivos. O psicadélico, claro e evidente, notava-se mais pela tristeza com que as paisagens dos canadianos eram pintadas, ou no exagero dos efeitos, que nunca chegavam a ser realmente ruidosos.
A actividade da banda seria retomada somente quatro anos depois devido à actividade dos projectos paralelos de Moya. É a vez de Stem Stem in Electro (2005), um trabalho que marca a evolução da banda de uma forma vincada: abandona-se a apatia característica do primeiro trabalho, sem nunca deixar para trás o psicadélico. A fórmula é, então, juntar o que estava presente no álbum anterior, mas que se encontrava fragmentado e distribuído pelas músicas - os efeitos, a voz, o delay e a oscilação da guitarra... - e adicionar a uma presença mais notória de teclas. As músicas adquirem uma força e uma intensidade muito maior, principalmente por não estarem tão dispersas. É um marco.
Mas o grande marco do trabalho dos Hrsta foi o trabalho do ano passado, Ghosts Will Come And Kiss Our Eyes. O projecto ganhou um novo alento com ajuda de Brooke Crouser (teclista) às composições de Moya - duo que agora é a alma da banda.
Ghosts Will Come Kiss Our Eyes é tudo menos um álbum sóbrio. É alucinado, uma viagem intensa por muita coisa - é psicadélico, fortemente. A primeira música tem tudo pare ser uma ode ao funcionamento da mente humana: começam teclados longos, com uma guitarra a fazer o som de fundo, de forma aguda e continuada, numa espécie de pensamento demorado; som que é quebrado por um repentino silêncio e a invasão de um contrabaixo tocado com arco - aquele som muito grave, que causa arrepios -, surge como uma revelação, que desencadeia mais pensamentos. E a música podia continuar... mas cede para uma música característica de Hrsta, à boa maneira dos registos anteriores, mas trabalhada. E é assim todo o álbum: é Hrsta no seu melhor, sempre com os seus pormenores inconfundíveis - desde a voz à guitarra -, adornados pelas características que evidenciam os projectos mais importantes de Montreal, a relação com a música clássica - o contrabaixo tocado com arco ajudado por um piano começam a fazer parte da construção das músicas.
O álbum decorre calmamente, sempre com melodias simples e bonitas, construídas e embelezadas com a capacidade de nos fazer levitar e de libertar a nossa imaginação - sempre psicadélico. "Hechicero del Bosque" começa por se fazer ouvir dentro destes moldes, mas, depois de quase se reduzir ao silêncio, parece despertar num espasmo, com uma bateria fortemente marcada num compasso mais acelerado, uma voz gritada ao fundo, os efeitos sempre a marcar o seu território e uma linha de baixo sôfrega, tornando-se quase pesada. Uma psicose que, se tivesse distorção, atrevo-me a dizer que poderia obra dos Neurosis; é, no entanto, Hrsta, e quanto a isso é impossível ter dúvidas ou criar confusões. E a partir deste ponto (até "Holiday", que retoma a fórmula de sempre), as músicas formam ambiências perfeitamente esquizofrénicas e - perdoem-me os Neurosis - neuróticas, de provocar calafrios.
Ghosts Will Come Kiss Our Eyes representa o auge de uma fórmula prometedora e muito bem explorada por Mike Moya e Brooke Crouse. Hrsta, pela seu rico background, é uma das bandas mais suis generis da música actual, e o seu último álbum é uma obra-prima da música Psicadélica pura - como já não se ouvia desde um Dark Side Of The Moon, dos Pink Floyd, arrisco-me a dizer.
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