O final do século trouxe uma dificuldade que tem de ser ponderada: que mais há para inventar? Toca-se tudo de todas as maneiras possíveis, e as grandes bandas, dos grandes génios, já tocaram os impossíveis. A música cai inevitavelmente na imitação e recuperação revivalista de bandas anteriores; só as identidades se renovam, os pormenores que lembram e que identificam certos grupos, como a voz, ou a mistura de influências e tendências.
As novas bandas, como The National, Black Rebel Motorcycle Club, Bloc Party, entre outros, recuperam as sonoridades dos grandes anos 60 e dos anos 80, mas não trazem ou fazem nada de realmente novo. Aliás, todas assumem uma influência em comum: Joy Division. O fenómeno Joy Division percebe-se dessa forma: mesmo não sendo uma banda que atingiu um grande reconhecimento enquanto no activo, a importância que teve, por introduzir o Pós-Punk, entende-se realmente na quantidade de bandas que influencia actualmente, sendo muito poucas as que não assumem o toque Joy Division na sua música.
Este novo século apresenta, também, o problema do crescimento das bandas. A música, cada vez mais industrializada, tem-se tornado num simples produto baseado em conceitos de imagem – aliado ao crescimento da MTV na divulgação da música (“vídeo killed the radio star”). Estes conceitos de imagem e os estudos de mercado são um obstáculo para bandas novas, com conceitos novos, à procura de emergir na cena musical actual, pois o público aponta sempre para o que já existe; é sabido que as evoluções, as novidades, surgem de choques ideológicos. Felizmente, a música, como cultura e produto humano da sociedade, encontra respostas, cuja mais expressiva é a Internet.
Este meio de comunicação é visto como o principal meio de roubo de propriedade e violação de direitos de autor da actualidade, e as editoras perdem, imediatamente, dinheiro com o acesso gratuito às músicas que os consumidores têm, através da Web. Mas a realidade é que a Internet é, actualmente, o meio de divulgação mais importante, a nível musical. O surgimento de bandas através da Internet é um fenómeno corrente (Arctic Monkeys, por exemplo) e cada vez mais comum. A prova destes factos é o crescimento da comunidade Myspace e o aparecimento de cada vez mais Netlabels – editoras independentes que trabalham através da Web, usando-a para divulgar as suas bandas. O novo meio de divulgação, apesar de menos lucrativo a curto prazo para as editoras, é uma garantia de actividade para as bandas que ainda não cresceram dentro do meio comercial e mais global da música. E é uma salvaguarda para as próprias editoras, que têm uma possibilidade de investimento mais alargada, e acabam por lucrar a longo prazo. Claro que a Net é muito mais produtiva para editoras mais pequenas, que ainda não têm um demasiado alargado e, em virtude deste facto, não têm tantas limitações e acabam por crescer com as próprias bandas, que são mais facilmente aceites nestas Labels mais pequenas, ao contrário do que acontecerá nas mais Mainstream.
A Internet está a ser vítima dos mesmos preconceitos que a rádio nos anos 20. Também esta representava a possibilidade de se ouvir a música de um artista sem se pagar direitos de autor. Olhar ao lucro imediato demonstra falta de alcance. Cedo, a rádio mostrou-se o meio de divulgação que aumentou as vendas de álbuns e alargou o público presente nos concertos. A Internet caminha no mesmo sentido. Os concertos são mais divulgados na Web, e também mais procurados, pois o conhecimento das músicas estendeu-se a níveis globais, assim como as próprias bandas e as suas músicas. Quanto ao consumo dos trabalhos editados, a Net, apesar da tecnologia, não tem a capacidade, ainda, para manter a qualidade sonora das músicas (o MP3 é um ficheiro de capacidade menor, precisamente para facilitar o acesso ao mesmo), pelo que, em diversas situações, a compra é uma consequência directa iminente; de qualquer modo, as editoras já adoptam políticas que procuram responder a este novo tipo de mercado, como a venda dos CDs nos próprios concertos, tornando a venda muito mais lucrativa, visto que não há intermediários de venda e revenda: é tão positivo para a editora como para o próprio consumidor.
O fenómeno Web também se mostrou o principal ponto de partida para as novas tendências musicais. Estas novas tendências e novos sons vieram reinventar a música na sua globalidade, negando as estruturas fixas e fórmulas de composição restritas, explorando as sonoridades de forma mais ambiental e melódica, procurando situações mais envolventes. É o chamado Post, ou pós qualquer coisa (normalmente Rock ou Doom). São precisamente essas estruturas regulares e monótonas que caracterizam a música Pop actual, em que a fórmula Verso-Refrão-Verso torna a música mais fácil de memorizar e, por isso, de adquirir maiores dimensões comerciais. O Post rejeita esta fórmula, explorando as músicas através de crescendos, mantendo uma base harmónica constante, proporcionando momentos mais introspectivos. As músicas tornam-se, então, muito mais longas que o normal, em busca de um clímax ambiental, sendo este outro grande obstáculo à divulgação do Post nos meios de comunicação mais comuns. A própria rejeição da estrutura Verso-Refrão-Verso torna essa situação extremamente complicada; as músicas de 7 minutos no mínimo só decretam a impossibilidade de divulgação através da TV e da rádio.
Desta forma, o surgimento destas novas tendências não seria possível se não fosse a Internet, comprovando-se assim a sua importância na cena musical de agora. Tanto o Post-Rock como o Post-Doom estão ainda em crescimento e abrangem multidões cada vez maiores, sem nunca se sujeitarem às influências directas dos media e à sua triagem no que toca a divulgação. Neste momento, é mesmo impossível conceber a música sem a Internet, tendo em conta o papel que a Web realiza na música actual. A música chegou a um patamar de globalidade nunca antes atingido ou imaginado, em que é possível tocar de tudo e ouvir de tudo sem ter a barreira procura-oferta a limitar stocks. A urgência não está em impedir o caminho actual da Internet e do MP3, mas sim em arranjar uma forma pragmática de a utilizar em proveito de uma sociedade em mutação e cada vez mais sedosa de informação e novidade, à semelhança do que as pequenas editoras têm feito. Tem sido um grande erro das grandes Labels rejeitar a Internet e o seu conceito; tem sido uma forma de impedir o progresso, na realidade, algo impossível. Os próprios mercados têm de acompanhar as necessidades da sociedade de consumo e saber adaptar-se, e não o contrário.
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