Não sei bem se vi o melhor guitarrista de sempre, mas sabem que mais? Gosto de acreditar que sim. E acredito. Acredito porque se houver um guitarrista melhor que este, esse guitarrista está acima de um deus. Paco de Lucía é andaluz, mesmo de aqui ao pé. Aliás, é-nos tão próximo que a sua própria mãe é portuguesa; Portugal "é como uma segunda casa", afirmou ele ontem durante o concerto. Mas comodismos à parte, que o concerto não primou pelo discurso "lambe-botas" de um músico cujas botas foram estupidamente lambidas ontem, mas valeu cada cêntimo pela melodia, pela energia e pela beleza do Flamenco que nos trouxe aquele septeto de grandes, enormes músicos.
O público já aguardava em burburinho quando o anfitrião subiu ao palco: Paco estava só com a sua guitarra. Senta-se e começa a discursar as suas notas lentamente, crescendo, tornando-se mais intenso. Cruza e descruza as pernas repetidamente, tentando pôr o público à vontade com o seu talento, com a sua música, com o seu génio. Era impossível, até porque este público era muito impressionável - infelizmente para qualquer bom apreciador, as boas partes das músicas eram abafadas por palmas analfabetas, que se seguiam depois das partes menos interessantes (se é que é possível afirmar isto) das músicas, ou seja, quando os músicos mostravam alguma velocidade no manejo do seu instrumento - e estava mal preparado para tal demonstração de humildade de um colosso assim. E faz-se uma música só que muito Flamenco e uma guitarra, génio a acompanhar com uma pitada de talento e temos serão garantido!
A próxima música tem algo de novo: um percussionista. Mas Paco de Lucía dita o ritmo da sua música e mostra que também é preciso ritmo para se tocar guitarra. Bate na guitarra, toca as cordas em mute, tudo com uma construção de fazer dançar a Torre Eiffel, dando o ponto de partida para o senhor que o acompanha. Depois, entram as suas duas vocalistas, um senhora e uma jovem senhora, elas, com uma voz incrível, encantaram e arrepiaram os "holé"s para fora das centenas de gargantas presentes.
Depois, outra música, outra novidade, palmas, de mais três pessoas no palco, a juntar às das cantoras e ao ritmo da percussão. Um era baixista (e que baixista), outro era guitarrista (infelizmente ofuscado pelo génio do Paco, que tanto espaço lhe deu, a ele e ao resto do septeto) e um flautista. Era momento da pausa: "Já"? Pois, ninguém queria acreditar que 45 minutos já tinham passado, só com 5 músicas. Mas passaram, infelizmente - eu ainda estava por lá, a ouvi-lo.
Depois de uma pausa, não há mais o corrupiu do "ora com este, ora com aquele", agora é, finalmente, o tempo do Septeto de Paco de Lucía: o próprio, um baixista, um guitarrista, um percussionista, um flautista com a sua transversal e duas vocalistas.
A partir daqui, o importante era o grupo, que actuou segundo uma lógica tipicamente jazzista, isto é, todos são músicos e todos sabem tocar. Assim, em cada música, havia solos, seguidos de outros solos, respeitando a tradição do jazz que impõe um pequeno silêncio para palmas, sem que a música pare realmente. E, mais uma vez, tudo passou num instante, o público continuava deambulante na sua condição de apreciador mal-educado e a bater palmas depois das partes rápidas, durante as partes bonitas e verdadeiramente complicadas das músicas e dos solos. Quando chegou ao fim, o público não o conseguiu aceitar, tão fugaz que foi o concerto. Bateram-se palmas incessantemente, durante largos minutos, até que o monstro, na sua simpatia (a qual emana, vê-se que Paco de Lucía já não é a estrela: é o músico; nota-se que há muita humildade e simpatia neste senhor de pouco cabelo e todo ele grisalho; nota-se que há muito espaço na sua música para todos os seus acompanhantes), volte ao palco para mais uma estonteante música. Foi o fim. Um concerto incrível, cheio de música.
Com tudo isto, só sinto uma enorme pena por ter assistido a um concerto em tal sala, o dito Campo Pequeno. O som estava terrível - muitos ecos e má distribuição do som, o que tornava alguns instrumentos quase inaudíveis -, a sala é bastante feia (admito que está manchada pela opinião que tenho das touradas), do sítio onde me encontrava, para além de super-distante, tinha a vista para o palco quase impedida por colunas de suporte, e, mais uma vez e com menos relação com a sala (quem sabe...), o péssimo público que quase pede uma crítica social.
Ainda assim... Quase duas horas de concerto? Ninguém o diria...
Deixo-vos, só, com uma amostra do génio deste senhor:
Aquilo que ele faz com uma guitarra (sim, ainda faz!)
Aquilo que ele faz com banda (mas neste último concerto foi num contexto muito mais Flamenco! Holé!!) - "Entre Dos Aguas"
E, finalmente, aquilo que ele faz quando cria (ele disse a um jornalista aquando de uma das suas passagens no Japão, estavam eles num andar acima do 60, no quarto do dito cujo, a conversar e o jornalista pergunta "o que é criar, para si?", ao que ele responde desta forma: vai até à janela, sobe para o parapeito e atira esta frase: "criar era eu atirar-me daqui e voar"!) - "Moasterio de Sal"
O público já aguardava em burburinho quando o anfitrião subiu ao palco: Paco estava só com a sua guitarra. Senta-se e começa a discursar as suas notas lentamente, crescendo, tornando-se mais intenso. Cruza e descruza as pernas repetidamente, tentando pôr o público à vontade com o seu talento, com a sua música, com o seu génio. Era impossível, até porque este público era muito impressionável - infelizmente para qualquer bom apreciador, as boas partes das músicas eram abafadas por palmas analfabetas, que se seguiam depois das partes menos interessantes (se é que é possível afirmar isto) das músicas, ou seja, quando os músicos mostravam alguma velocidade no manejo do seu instrumento - e estava mal preparado para tal demonstração de humildade de um colosso assim. E faz-se uma música só que muito Flamenco e uma guitarra, génio a acompanhar com uma pitada de talento e temos serão garantido!
A próxima música tem algo de novo: um percussionista. Mas Paco de Lucía dita o ritmo da sua música e mostra que também é preciso ritmo para se tocar guitarra. Bate na guitarra, toca as cordas em mute, tudo com uma construção de fazer dançar a Torre Eiffel, dando o ponto de partida para o senhor que o acompanha. Depois, entram as suas duas vocalistas, um senhora e uma jovem senhora, elas, com uma voz incrível, encantaram e arrepiaram os "holé"s para fora das centenas de gargantas presentes.
Depois, outra música, outra novidade, palmas, de mais três pessoas no palco, a juntar às das cantoras e ao ritmo da percussão. Um era baixista (e que baixista), outro era guitarrista (infelizmente ofuscado pelo génio do Paco, que tanto espaço lhe deu, a ele e ao resto do septeto) e um flautista. Era momento da pausa: "Já"? Pois, ninguém queria acreditar que 45 minutos já tinham passado, só com 5 músicas. Mas passaram, infelizmente - eu ainda estava por lá, a ouvi-lo.
Depois de uma pausa, não há mais o corrupiu do "ora com este, ora com aquele", agora é, finalmente, o tempo do Septeto de Paco de Lucía: o próprio, um baixista, um guitarrista, um percussionista, um flautista com a sua transversal e duas vocalistas.
A partir daqui, o importante era o grupo, que actuou segundo uma lógica tipicamente jazzista, isto é, todos são músicos e todos sabem tocar. Assim, em cada música, havia solos, seguidos de outros solos, respeitando a tradição do jazz que impõe um pequeno silêncio para palmas, sem que a música pare realmente. E, mais uma vez, tudo passou num instante, o público continuava deambulante na sua condição de apreciador mal-educado e a bater palmas depois das partes rápidas, durante as partes bonitas e verdadeiramente complicadas das músicas e dos solos. Quando chegou ao fim, o público não o conseguiu aceitar, tão fugaz que foi o concerto. Bateram-se palmas incessantemente, durante largos minutos, até que o monstro, na sua simpatia (a qual emana, vê-se que Paco de Lucía já não é a estrela: é o músico; nota-se que há muita humildade e simpatia neste senhor de pouco cabelo e todo ele grisalho; nota-se que há muito espaço na sua música para todos os seus acompanhantes), volte ao palco para mais uma estonteante música. Foi o fim. Um concerto incrível, cheio de música.
Com tudo isto, só sinto uma enorme pena por ter assistido a um concerto em tal sala, o dito Campo Pequeno. O som estava terrível - muitos ecos e má distribuição do som, o que tornava alguns instrumentos quase inaudíveis -, a sala é bastante feia (admito que está manchada pela opinião que tenho das touradas), do sítio onde me encontrava, para além de super-distante, tinha a vista para o palco quase impedida por colunas de suporte, e, mais uma vez e com menos relação com a sala (quem sabe...), o péssimo público que quase pede uma crítica social.
Ainda assim... Quase duas horas de concerto? Ninguém o diria...
Deixo-vos, só, com uma amostra do génio deste senhor:
Aquilo que ele faz com uma guitarra (sim, ainda faz!)
Aquilo que ele faz com banda (mas neste último concerto foi num contexto muito mais Flamenco! Holé!!) - "Entre Dos Aguas"
E, finalmente, aquilo que ele faz quando cria (ele disse a um jornalista aquando de uma das suas passagens no Japão, estavam eles num andar acima do 60, no quarto do dito cujo, a conversar e o jornalista pergunta "o que é criar, para si?", ao que ele responde desta forma: vai até à janela, sobe para o parapeito e atira esta frase: "criar era eu atirar-me daqui e voar"!) - "Moasterio de Sal"